domingo, 3 de junho de 2018

Poema 14
Brincas todos os dias com a luz do Universo.
Subtil visitadora, chegas na flor e na água.

És mais do que a pequena cabeça branca que aperto
como um cacho entre as mãos todos os dias.
.
Com ninguém te pareces desde que eu te amo.
Deixa-me estender-te entre grinaldas amarelas.
Quem escreve o teu nome com letras de fumo
entre as estrelas do sul?
Ah, deixa-me lembrar como eras então,
quando ainda não existias.
.
Subitamente o vento uiva e bate à minha janela fechada.
O céu é uma rede coalhada de peixes sombrios.
Aqui vêm soprar todos os ventos, todos.
Aqui despe-se a chuva.
.
Passam fugindo os pássaros
O vento. O vento.
Eu só posso lutar contra a força dos homens.
O temporal amontoa folhas escuras
e solta todos os barcos que esta noite amarraram ao céu.
.
Tu estás aqui. Ah tu não foges.
Tu responder-me-ás até ao último grito.
Enrola-te a meu lado como se tivesses medo.
Porém mais que uma vez correu uma sombra estranha
pelos teus olhos.
.
Agora, agora também, pequena, trazes-me madressilva,
e tens até os seios perfumados.
Enquanto o vento triste galopa matando borboletas
eu amo-te, e a minha alegria morde a tua boca de ameixa.
.
Quanto te haverá doído acostumares-te a mim,
à minha alma selvagem e só,
ao meu nome que todos escorraçam
Vimos arder tantas vezes a estrela d' alva beijando-nos os olhos
e sobre as nossas cabeças distorcerem-se os crepúsculos
em leques rodopiantes.
.
As minhas palavras choveram sobre ti acariciando-te.
Amei desde há que tempo o teu corpo de nácar moreno.
Creio-te mesmo dona do Universo.
Vou trazer-te das montanhas flores alegres,"copihues",
avelãs escuras, e cestos silvestres de beijos.
.
Quero fazer contigo
o que a primavera faz com as cerejeiras.

Pablo Neruda 
"Vinte Poemas de Amor"

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